sábado, 6 de outubro de 2007

Um fracasso

Um fracasso minha campanha para que as pessoas fossem mais ao cinema. Após ter saído no domingo noturno de uma sessão inebriante com a certeza de que aquele ambiente e seus acontecimentos e mecanismos próprios eram, sim, realmente, mágicos e altamente fecundos em relação às emoções e criatividades dos participantes desse verdadeiro ritual de transmutação, senti-me forte por ter finalmente encontrado um motivo, uma causa concreta e merecedora que justificasse e impulsionasse meus hábitos e minhas atitudes a partir de então.
Pois eis que dois dias após incluir nas mais díspares conversas comentários sobre a necessidade espiritual de se ir ao cinema – ainda mais quando em contato com estudantes da sétima arte -, cai a notícia: fechou o Cine Capitólio.
O Cine Capitólio é um dos dois cinemas de Pelotas. Possui duas salas, uma pequena e convencional na disposição da tela e das poltronas e uma outra, a sala um, enorme, uma tela gigantesca acima de todos os setecentos fiéis assentos posicionados um atrás do outro com uma suave elevação em direção aos frontais e aos finais. Um parêntesis deitado, assim lembro, estranho, exótico, MASSA, o Cine Capitólio. Fechou.
Sobrou o outro, chamado CineArt, três salas, alguma centena de lugares, posicionado num dos tantos shoppings-galeria do calçadão central pelotense. No quarto andar do dito estabelecimento comercial, chega-se até ele através de 3 escadas rolantes mumificadas responsáveis pela circulação de pessoas entre os andares. Detalhe que é uma única – e estreita – escada de ligação por piso, o que leva os rapazes a aguardar para subir quando alguma moça desce. Cavalheirismo old times na marra. Mas minto, ou omito (ominto), se não conto do elevador. Há, sim, um elevador, um metálico e alucinado elevador, dir-se-ia comprado de um parque de diversões. Dir-se-ia. Hoje passei lá, uma cerca amarela não permitia o acesso: há de ter salvo muitas vidas.
Mas aí já escondi outra escada, uma em espiral, essa larga, antiga, no fundo do shopping. Atravessa os andares e leva até o 2m por 2m pôster do Homem-Aranha 2 que lhe acompanha os últimos degraus. Findos, eis o CineArt. Caminhei até ali para tirar algumas fotos, mas, desculpem-me, não havia o quê ser fotografado. Rodeei pelo Hall de entrada, olhei alguns pôsteres e voltei à agora íngreme escadaria. No andar de baixo um segurança entrou no carrossel. Me vendo olhar o chão do primeiro andar pelo vão entre os contorcionismos arquitetônicos, disse: “Não pula que tu vai se machucar”. Ri e não deixei de aproveitar:
- Tu viu que fecharam o outro cinema?
Ele:
- Hein?
- Fecharam o outro cinema, o Capitólio.
- Ah, sim, sim, também, não dá dinheiro. Vai virar igreja. Nada dá mais dinheiro que a fé. – Segurei o “FÉ DOS BOBOS!” pra saborear a cereja – A fé remove montanhas, guri.
Vou até o Capitólio. Alguns homens conversam em frente, escorados num carro. Eu do outro lado da rua tiro algumas fotos. Ao meu lado, um sujeito imita com o celular. Penso em dizer alguma coisa, um “bah” grave e pesaroso, mas não sai nada. O ar carregado de vislumbres do quê o falecido Cine Capitólio poderia muito em breve se tornar encarcerava qualquer palavra a respeito dentro da boca e do coração de qualquer um. Atravesso a rua, fotos e fotos, e ouço um pouco da conversa dos três sujeitos. Apenas um deles fala, o maior, mais novo e mais careca, a balaca num esquisito fone de um ouvido apenas: “Tem que fechar, não adianta, ali no outro bota duzentos e tá lotada a sala, aqui... Pssssss.”
É tudo. O poder dos idiotas.


Save yourself.


A reforma ficará DIVINA.


O presunto.

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu passei aí na frente. Comentei a um amigo que esse fato tornou-se corriqueiro. É o que aconteceu ao Pampa em Passo Fundo e o Baltimore em Porto Alegre. Viraram estacionamento!

O fato é que não vi shopping em Pelotas, aí tem esses cinemas charmosos com as portas na rua, dos quais gosto tanto.